2009/02/23








(à memória de A. A. LAGOA HENRIQUES, 1923-2009)

Vi como um danado.
Amei as coisas sem sentimentalidade nenhuma.
Nunca tive um desejo que não pudesse realizar, porque nunca ceguei.
Mesmo ouvir nunca foi para mim senão um acompanhamento de ver.
Compreendi que as cousas são reais e todas diferentes umas das outras;
Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento.
Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.

Um dia deu-me o sono como a qualquer criança.
Fechei os olhos e dormi.


FERNANDO PESSOA, Portugal,
in [275] Alberto Caeiro, 1915

2009/02/21


A hipótese de legalização da eutanásia ou do suicídio assistido, bem como a possibilidade de, finalmente, serem legalizados os "testamentos vitais" que nos permitiriam evitar o risco de sermos transformados em carcaças respiratórias ou de sermos minuciosamente torturados em nome do respeito pela vida, são igualmente consideradas medidas eleitoralistas. Provavelmente são, também, medidas que relevam mais de considerações eleitoralistas do que de uma vontade genuína de melhorar a qualidade da nossa vida e da nossa morte mas, se vierem a ser concretizadas, contribuirão seguramente para um Portugal melhor.
As torturas hospitalares infligidas para nosso bem, de que todos podemos ser vítimas quando já não pudermos expressar a nossa vontade, não nos devem fazer esquecer a sorte daqueles que foram torturados em Guantánamo e que, provavelmente também com fins eleitoralistas, irão ser recolhidos no nosso país.

FRANCISCO TEIXEIRA DA MOTA, Portugal,
in jornal "Público", 21.02.2009

2009/02/19


C´était une jolie portugaise, aux yeux à la fois chauds et tristes, d'une distinction extrême. Elle était petite à côté de son mari, fine et joliment tournée. Elle portait une robe de dentelle noire. A chacun, elle disait quelques mots de bienvenue, d'une voix grave et prenante. Elle m'adressa la parole en français, d'une façon un peu chantante, pleine de séduction, et que je n'ai pas oubliée.

THOMAS OWEN, Bélgica,
in "L'Impromptu d'Évora", 1972



Era uma bela portuguesa, de olhos ao mesmo tempo quentes e tristes, de uma distinção extrema. Era pequena ao lado do marido, fina e bem torneada. Usava um vestido de renda preta. Dava a cada um algumas palavras de boas-vindas, com voz grave e cativante. Dirigiu-se-me em francês, num tom um pouco cantante e cheio de sedução, que não esqueci.

2009/02/12




CUCUMBER CREAM
2T lemon juice, 1 T honey, 1 cup drained diced cucumber, 1 cup yogurt, salt, pepper

Mix lemon juice, honey and cucumber. Whip yogurt and fold in the cucumber mixture. Season with salt and pepper. Serve cold with broiled fish, cold poached fish, shrimp salad or sliced tomato.

JEANNE VOLTZ, E.U.A.,
in The Los Angeles Times "Natural Foods Cookbook", 1973



CREME DE PEPINO
2 colheres de sopa de sumo de limão, 1 colher de sopa de mel, 1 chávena de cubos de pepino escorridos, 1 chávena de iogurte, sal, pimenta

Misturar o sumo de limão, o mel e o pepino. Bater o iogurte e juntar. Temperar com sal e pimenta. Servir com peixe grelhado, peixe cozido frio, salada de camarão ou rodelas de tomate.

2009/02/02


Havia um sofá que se achava triste. E uma poltrona que vivia alegre. Havia uma cadeira de baloiço que ficava tonta. E uma mesa de centro que temia manchas. Havia dois quadros macambúzios na parede. Havia um tapete que queria ser uma estante. Havia uma estante que detestava livros. As almofadas do sofá viviam em alegre cavaqueira mas não convenciam ninguém. Nenhuma quisera ser solteira. Havia um candelabro apaixonado por um lustre de seis lâmpadas. Havia um lustre de seis lâmpadas com vertigens. Havia um pó traiçoeiro. Havia caruncho guerreiro. Havia uns mosaicos psicadélicos, que preferiam ser sóbrios. Havia uns redondos que queriam ser quadrados, havia uns vermelhos que queriam ser azuis. Havia riscas que queriam ser flores. Havia uns padrões dos anos oitenta, que queriam ser dos anos 30.


EILEEN ALMEIDA BARBOSA, Cabo Verde,
in “A Sala”, 2007