2009/07/30


Little fly,
Thy summer's play
My thoughtless hand
Has brushed away.

Am not I
A fly like thee?
O art not thou
A man like me?

For I dance,
And drink, and sing,
Till some blind hand
Shall brush my wing.

WILLIAM BLAKE, U.K., in "The Fly",
Songs of Experience, 1794




Pequena mosca,
Vossa brincadeira de Verão
Foi varrida
Pela minha estouvada mão.

Eu não serei
Mosca como vós?
Ah não sois vós
homem como eu?

Pois que eu danço,
E bebo, e canto,
Até que mão cega
Me varra a asa.

2009/07/18


Manger un fruit c'est faire entrer en soi un bel objet vivant, étranger, nourri et favorisé comme nous par la terre; c'est consommer un sacrifice où nous nous préférons aux choses. Je n'ai jamais mordu dans la miche de pain des casernes sans m'émerveiller que cette concoction lourde et grossière sût se changer en sang, en chaleur, peut-être en courage. Ah, pourquoi mon esprit, dans ses meilleurs jours, ne possède-t-il jamais qu'une partie des pouvoirs assimilateurs de mon corps?

MARGUERITE YOURCENAR, Bélgica,
in "Mémoires d'Hadrien", 1951



Comer um fruto é fazer entrar em nós um belo objecto vivo, estrangeiro, alimentado e protegido como nós pela terra; é consumar um sacrifício onde nos sobrepomos às coisas. Nunca mordi a bucha de pão das casernas sem me maravilhar por essa amálgama pesada e grosseira poder transformar-se em sangue, em calor, quiçá em coragem. Ah, porque é que o meu espírito, nos seus dias melhores, não possui senão uma parte do poder de assimilação do meu corpo?

2009/07/05




Pergunta-me «Já é para ir jantar?» como quem diz: «Se não tens nada para dizer, baza.» É assim que ele e os amigos falam: «baza», «bué», «baril», «curte», «cena», «cota».
Respondo: «Ainda não, mas deve estar quase. A tua mãe ainda não chamou... Essa música não está muito alta?»
«Hã?»
«Nada, nada.»
Abro Os Lusíadas ao calhas. Ele escreve números complicados no caderno. Leio: «Tempo cedo virá que outras vitórias/Estas que agora olhais abaterão./Aqui se escreverão novas histórias/Por gentes estrangeiras que virão.» Toca o telefone na sala, vou atender.
Mal saio, o Luís Filipe fecha a porta do quarto.


JACINTO LUCAS PIRES, Portugal,
in "Gente Diferentíssima", 2003